A Psicanálise Relacional ao mais alto nível. A recuperação do diálogo Psicanalítico Ibérico. O 1º Congresso Ibérico de Psicanálise Relacional. Razões que se bastam a si próprias para emoldurar a grande expectativa em torno deste encontro singular, como tem sido característica da APPSI e IARPP-Portugal, dedicado às “Transformações” na clínica Psicanalítica. Para vislumbrar um pouco do que por lá se vai passar, fomos falar com alguns dos principais oradores, aos quais colocámos as mesmas perguntas.
Michael Eigen
Psicanalista; Professor Associado no Programa de Pós-Doutoramento em Psicoterapia e Psicanálise da Universidade de Nova Iorque; Membro Sénior da National Association for Psychoanalysis (E.U.A).
1. O que espera do 1º Congresso Ibérico de Psicanálise Relacional, que vai ter lugar em Cáceres?
Eu vou com a mente aberta. O que é que vai acontecer? Ventos rudes e gentis irão tocar a minha alma? Para onde vou ser levado? Algo que não espero vai acontecer. Um rosto amável, uma voz gentil? Uma mão que atravessa o oceano? Talvez um momento de contacto de coração para coração, um toque que vem de dentro. Podem as mentes tocar uma na outra? Como podem não o fazer?
2. Qual a relevância de falar em “Transformações” no contexto Psicanalítico actual?
Freud escreveu a Fliess: se eles soubessem o que nós trazemos, fugiriam. Nós somos avenidas de transformação, como os mistérios ancestrais. Freud escreveu acerca da transmissão inconsciente para inconsciente. Bion: psicose para psicose. Lankavatara Sutra: transformações sem palavras, sem imagens. Tal como o F em O e o T em O de Bion – fé (F) como a atitude psicanalítica, O como realidade emocional desconhecida, e T como transformações no desconhecido. Desconhecido para desconhecido. Talvez, por vezes, a sensação de que algo está a acontecer. Penso nas palavras de Eddington: “algo desconhecido está a fazer não sabemos o quê”.
3. Qual a característica mais relevante que um Psicanalista/Psicoterapeuta deve ter para permitir a criação de um espaço de transformação numa relação terapêutica?
O bloco não esculpido do Tao. Bion gostava de citar a “capacidade negativa” de Keats, ser capaz de viver na ambiguidade sem irritabilidade, indo para além dos factos e das razões. Mas após mais de 50 anos de trabalho, eu tenho de dizer: “eu não sei.” Ou então, quase tudo pode estar envolvido no trabalho transformacional. Uma pessoa é mais activa, outra mais ofensiva, outra mais venturosa, ou pacífica ou cuidadosa ou intelectual ou apaixonada ou sensível. Nunca se sabe o que é que vai magoar ou ajudar. Tal como um dos meus Analistas disse quando lhe perguntei se me podia ajudar: “podemos apenas tentar”. Gostaria de falar de uma certa sensibilidade ou capacidade de cultivar “papilas gustativas” psíquicas sensitivas. Mas, por vezes, a insensibilidade pode ajudar. Não sabemos. Aguentamo-nos lá, somos derrotados, reorganizamo-nos, voltamos para mais. Talvez isto faça parte, uma certa lealdade, disponibilidade para voltar e recomeçar uma e outra vez.
Filipa Canêlo
Gonçalo Neves
[Entrevista realizada por e-mail]